Capítulo 11

NA MANHÃ SEGUINTE, pulei o café da manhã com a minha família para me recompor. Não queria que ninguém visse como o desfile tinha me deixado abalada. Construí um escudo ao meu redor, tentando recuperar a calma e o fôlego.
Neena cantarolava enquanto organizava o quarto, o que era ótimo. Ela não só havia sido gentil comigo quando cheguei do desfile como não fizera uma pergunta sequer, nem tocara no assunto. Não precisava me preocupar com ela, e por isso ela não podia deixar o palácio. Como eu ia ficar?
— Acho que hoje é dia de calça, Neena — falei.
Ela parou de cantarolar.
— Mais preto?
— Pelo menos um pouco.
Trocamos um sorriso e ela me entregou uma calça preta justa, que combinei com saltos que me deixariam morta até o meio-dia. Escolhi uma camisa florida e um colete. Para finalizar, encontrei uma tiara com joias que combinavam com a camisa. Estava pronta.
Decidi fazer exatamente o que meu pai tinha feito na Seleção dele. No primeiro dia, ele mandou para casa pelo menos seis garotas. Meu plano era eliminar, no mínimo, o dobro. Com certeza, eliminar todos os candidatos que menos tinham a ver comigo seria uma demonstração de como eu levava o processo a sério, de como o resultado era importante para mim.
Queria que houvesse um jeito de fazer isso sem as câmeras, mas elas eram um mal necessário. Eu tinha uma lista pronta na cabeça e sabia vagamente o que queria dizer. Mas, se cometesse algum erro na presença dos jornalistas, as coisas sairiam tão mal quanto ontem… Ou seja, eu precisava ser perfeita.
Como o Salão das Mulheres era considerado propriedade da rainha, qualquer homem precisava pedir permissão antes de entrar. O Salão dos Homens, porém, apenas foi montado para a minha conveniência e não havia tanta formalidade. Assim, pude fazer uma entrada bem deslumbrante: abri as portas duplas do salão e deixei a corrente de vento jogar meus cabelos para trás.
Todos os Selecionados olharam imediatamente para mim. Alguns se levantaram com um salto, outros se distanciaram dos jornalistas para acompanhar as câmeras.
Passei por Paisley Fisher e o escutei engolir em seco quando parei ao seu lado. Sorrindo, coloquei a mão em seu ombro e disse:
— Pode ir.
Ele olhou para as pessoas em volta.
— Ir?
— Sim. Obrigada pela participação, mas sua presença no palácio não é mais necessária.
Como ele continuou parado, cheguei mais perto e sussurrei minhas instruções.
— Quanto mais você ficar, mais vergonhoso será. É melhor sair.
Me afastei, mas pude notar a raiva em seus olhos enquanto ele saía lentamente do salão.
Não consegui imaginar o motivo de tamanho aborrecimento. Não foi como se eu tivesse enxotado o rapaz ou gritado com ele. Por dentro, até fiz um elogio a mim mesma por me livrar de alguém tão infantil. Tentei me lembrar da lista. Quem era o próximo? Ah… esse merecia.
— Blakely, não é?
— Si… — a voz dele desafinou e ele teve que começar de novo. — Sim, Alteza.
— Quando nos conhecemos, você não tirou os olhos do meu decote.
O rosto dele empalideceu, como se acreditasse de verdade que sua atitude tinha sido tão sutil que ninguém perceberia.
— Não se esqueça de dar uma olhada satisfatória também na parte de trás quando sair.
Fiz questão de falar alto o suficiente para que as câmeras e os outros garotos ouvissem. Minha esperança era que a humilhação desencorajasse os outros a se comportar daquele jeito. Blakely baixou a cabeça e saiu do salão.
Parei na frente de Jamal.
— Pode ir também.
Ao lado dele, Connor começou a suar em bicas de novo.
— E você pode acompanhá-lo — emendei.
Eles trocaram um olhar confuso e saíram juntos, balançando a cabeça.
O próximo era Kile. Diferente dos outros, ele não desviou o rosto. Pelo contrário: olhou bem nos meus olhos. Em silêncio, ele me implorava para acabar com seu sofrimento e tirá-lo dali.
Provavelmente era o que eu faria se não achasse que a mãe dele iria me matar – porque eu teria que mandá-lo para fora do palácio – e se não tivesse visto o nome dele na maioria dos cartazes durante o desfile. Claro, Kile era o Selecionado da cidade, de modo que a multidão talvez fosse parcial. Ainda assim, não podia me livrar dele. Não naquele momento.
Ao lado dele, Hale engoliu em seco. Lembrei como ele tinha me protegido durante o desfile, de como levou golpes direcionados a mim, alguns dos quais pareceram bem doloridos.
Me aproximei dele e disse com suavidade:
— Obrigada por ontem. Você foi muito corajoso.
— Não foi nada — ele garantiu. — Embora não tenha dado para salvar o terno — complementou em tom de piada, tentando fazer a situação ficar mais leve.
— Que pena.
Baixei os olhos e continuei andando. As câmeras provavelmente não captaram a conversa, mas sabia que tinham captado nossos sorrisos. Me perguntei o que fariam com aquela imagem.
— Issir — eu disse para um rapaz de cabelo lambido e corpo raquítico. — Não. Obrigada.
Ele sequer questionou. Corou e fugiu o mais rápido possível.
Ouvi um sussurro e quis saber quem ousava falar naquele momento. Virei a cabeça com tudo e deparei com o intérprete de Henri descrevendo a cena para o amigo o mais rápida e discretamente que podia. O rosto de Henri estava tenso, mas ele terminou de ouvir, levantou os olhos para mim e sorriu. Ele tinha um sorriso pateta e o cabelo encaracolado de um jeito que parecia em movimento mesmo quando ele estava parado.
Ai. Minha intenção era acabar com o sofrimento dele e o mandar para casa, mas ele parecia tão encantado de estar no palácio. Alguns precisavam ficar mesmo, e Henri era inofensivo.
Dispensei Nolan apenas com um gesto da mão ao passar por ele e em seguida anunciei a Jamie que seu pedido de pagamento tinha sido a maneira mais ofensiva possível de se apresentar.
Continuei circulando pelo salão para ter certeza de que tinha falado com todos que queria fora. As reações dos que foram poupados variaram do interessante ao bizarro. Holden não parava de engolir em seco, à espera de que eu soltasse a bomba, ao passo que Jack sorria de um jeito estranho, quase como se achasse tudo aquilo divertido ou empolgante. Por fim, encontrei Ean, que em vez de desviar o olhar resolveu piscar para mim.
Reparei que ele estava sentado sozinho, com um diário de couro e uma caneta como companhia.
Parecia que não estava no palácio para fazer amigos.
— Piscar já é um pouco ousado, não acha? — perguntei em voz baixa.
— Que princesa ia querer ao seu lado um homem que não fosse ousado?
Levantei a sobrancelha, impressionada.
— Você não tem receio de ser autoconfiante demais?
— Não. É o que sou. E não pretendo esconder nada de você.
Havia algo de quase assustador na presença dele, mas gostei da coragem de ser verdadeiro. Notei a câmera atrás dele, que vinha captar minha expressão e, segurando o riso, balancei a cabeça para Ean.
Segui em frente, acrescentando Arizona, Brady, Pauly e MacKendrick às fileiras dos eliminados. Se minhas contas estavam certas, onze estavam fora.
Assim que todos os eliminados saíram, fui até a porta e me voltei para os candidatos remanescentes.
— Se vocês ainda estão aqui, significa que fizeram algo entre o nosso primeiro encontro e agora que me impressionou, ou que pelo menos tiveram o bom senso de não me ofender.
Alguns sorriram, provavelmente por lembrar de Blakely, enquanto outros permaneceram parados e atônitos. Continuei:
— Encorajo todos a agir de maneira cautelosa e refletida, porque levo isto muito a sério. Isto não é um jogo, cavalheiros. Isto é a minha vida.
Fechei as portas atrás de mim e ouvi o alvoroço por minha causa. Alguns riam, outros suspiravam, enquanto alguém simplesmente repetia “Ai, caramba! Ai, caramba!” o tempo todo. As vozes dos jornalistas se sobressaíam, encorajando todos a relatar a sensação depois da primeira eliminação.
Com um longo suspiro, saí me sentindo confiante. Tinha dado um passo decisivo, e meu pai podia ficar tranquilo: a Seleção corria da maneira correta e eu não o decepcionaria.


Para compensar a primeira noite sem graça e a completa ausência de interação após o desfile do dia anterior, naquela noite convidamos os garotos para um chá antes do jantar, quando conheceriam os moradores do palácio e, claro, conversariam comigo, sua amada futura noiva. Meus pais estavam lá, ao lado de Ahren, Kaden e Osten. Josie veio com os Woodwork – que se esforçavam muito para não ficar em cima do filho o tempo todo – e madame Lucy circulava pelo ambiente, sem falar com ninguém, mas com uma aparência adorável. Ela nunca tinha ligado muito para multidões.
Eu tinha trocado o vestido para o jantar e calçado um par de saltos que destruíam os dedos do pé. Ainda estava curtindo a euforia pós-eliminação, contente por dar passos que ajudaram meu pai. Mas a euforia se desfez assim que Ahren veio até mim com um brilho de advertência nos olhos.
— O que diabos você fez com eles? — ele perguntou em tom acusatório.
— Nada — jurei. — Promovi uma eliminação. Queria mostrar a todos que isto é importante para mim. Como o papai fez na vez dele.
Ahren levou a mão à testa.
— Você passou o dia inteiro com o nariz enfiado em relatórios? — ele quis saber.
— Claro que sim — respondi. — Talvez você não tenha notado, mas esse é meio que o meu emprego.
Ahren se inclinou na minha direção antes de falar:
— As filmagens te pintaram como uma viúva negra, enxotando os garotos com cara de presunção. E você se livrou de um terço deles, Eadlyn. Isso não faz os candidatos parecerem importantes. Na verdade, faz os candidatos parecerem descartáveis.
Eu já sentia o sangue sumir do meu rosto quando Ahren acrescentou, sussurrando:
— Dois deles perguntaram da forma mais cautelosa e discreta possível se existia alguma chance de você preferir garotas.
Deixei escapar um som que não era bem uma risada.
— Claro, porque a única maneira de eu gostar de homens é me curvar aos pés deles.
— Não é o momento de protestar, Eadlyn. Você precisa ser graciosa.
— Com licença, Alteza.
Tanto Ahren como eu nos viramos ao ouvir nosso título, e dei de cara com uma jornalista cuja expressão em seus olhos e sorriso beirava a loucura.
— Detesto interromper, mas gostaria de saber se poderia fazer uma breve entrevista com a princesa antes de fechar a matéria.
A jornalista mostrou os dentes de novo, e não consegui afastar a sensação de que eu estava prestes a ser engolida viva, no sentido literal ou figurado.
— Ela adoraria — respondeu Ahren antes de me beijar na testa e desaparecer.
Meu pulso disparou. Não tinha me preparado para aquilo. Mas, de todas as coisas que podiam acontecer naquele momento, me recusei a deixar o público me ver suar.
— Alteza, a senhorita eliminou onze pretendentes hoje. Não acha que o corte foi um pouco drástico?
Endireitei os ombros e dei um sorriso doce.
— Certamente compreendo por que alguns podem achar isso — respondi com generosidade — mas se trata de uma decisão muito importante. Não creio que seria sábio perder tempo com jovens rudes ou inexpressivos. Espero que com um grupo reduzido eu seja capaz de conhecer melhor esses cavalheiros.
Examinei as palavras mentalmente. Nada humilhante ou incriminador na minha fala.
— Sim, mas por que a senhorita foi tão dura? Alguns foram dispensados simplesmente com um “não” ou um toque no ombro.
Tentei não deixar a preocupação transparecer no meu rosto. Na hora, tudo tinha aparecido até engraçado.
— Ninguém condena meu pai quando ele é severo. Não acho justo ser vista como cruel quando ajo de maneira similar. A decisão que devo tomar é muito séria e tento agir sabiamente.
Embora quisesse gritar, pronunciei as palavras com a voz que me treinaram para usar em entrevistas. Até consegui sorrir na maior parte da resposta.
— Mas um deles chorou quando a senhorita deixou o salão — ela me informou.
— Como? — perguntei com receio de que estivesse cada vez mais pálida.
— Um dos Selecionados chorou quando a eliminação terminou. A senhorita acha que é uma reação normal ou que pode ter sido provocada por sua severidade com eles?
Engoli em seco, pensando no que dizer.
— Tenho três irmãos. Todos choram, e posso garantir a você que os motivos raramente fazem sentido para mim.
Ela deu uma risadinha e emendou mais uma pergunta:
— Então a senhorita não acha que foi dura com eles?
Eu sabia o que ela estava fazendo: cutucando com a mesma pergunta até que eu cedesse. E estava bem perto de levar a melhor.
— Sou incapaz de imaginar como seria estar do outro lado e ser eliminada tão cedo. Mas, com exceção de meu pai, ninguém aqui sabe como é estar do lado de cá. Farei o melhor para encontrar um marido digno. E se esse homem não puder aguentar uma ou duas palavras duras, então, com certeza não vai aguentar ser príncipe. Pode confiar!
Coloquei a mão no braço dela, como se tivesse contado uma piada ou fofoca. Era uma técnica de desarme.
— Por falar nos pretendentes, peço licença, mas preciso passar um tempo com eles — concluí.
A jornalista abriu a boca para fazer mais uma pergunta, mas virei de costas e saí de cabeça erguida.
Não sabia o que fazer. Não podia partir direto para as bebidas, não podia gritar todos os palavrões que conhecia e não podia correr para os braços dos meus pais. Precisava parecer contente, então, dei voltas pelo salão, sorrindo e piscando para os garotos com quem cruzava.
Percebi que essas pequenas coisas bastavam para fazê-los sorrir para mim ou mudar de postura. Em vez de se retrair, suas expressões se suavizavam. Dava para ver que esses breves momentos de gentileza já apagavam as lembranças da manhã no Salão dos Homens. Desejei com todas as forças que o público deixasse essa história de lado tão rapidamente quanto os rapazes.
Percebi depois de um tempo que apenas um deles teria coragem suficiente para vir falar comigo. E esse alguém era Hale.
— Então, se a ideia é tomar um chá antes do jantar — ele disse, aparecendo ao meu lado — de que tipo de chá a princesa mais gosta? — perguntou, tomando um gole de sua xícara e sorrindo timidamente.
Hale era uma pessoa terna sem fazer muito esforço, como madame Marlee, e era fácil manter uma conversa com ele. Naquele momento, fiquei mais grata do que jamais poderia ter imaginado por ter sido ele o primeiro a falar comigo. Era a segunda vez que me salvava.
— Depende do meu humor. Ou da estação do ano. Por exemplo, não consigo tomar chá branco no inverno. Mas chá preto é uma boa pedida.
— De acordo — ele disse, acenando com a cabeça.
— Ouvi dizer que alguém chorou depois que eu saí hoje de manhã. É verdade?
Hale arregalou os olhos e soltou o ar.
— Foi o Leeland. Pensei que ele tivesse quebrado um osso ou coisa assim. Levamos quase uma hora para acalmá-lo.
— O que aconteceu?
— Você aconteceu! Você entra, caçando pelo salão, eliminando caras aleatoriamente. Acho que ele tem um jeito mais tímido, e você o deixou bem abalado.
Vi que Leeland estava sozinho em um canto. Se eu estivesse sinceramente à procura de um marido, ele já estaria fora. Fiquei um pouco surpresa por ele não ter pedido para sair.
— Acho que fui mais insensível do que pretendia.
Hale deu uma risada e comentou:
— Você não precisa ser insensível. Todos sabemos quem você é e o que pode fazer. Respeitamos isso.
— Diga isso para o cara que me perguntou quando ia receber o pagamento — resmunguei.
Ele não tinha resposta para isso, e me senti mal por ter emperrado nossa conversa.
— Então, o que vai ser hoje? — perguntei na tentativa de recuperar a compostura.
— Perdão?
— Como você vai provar que é digno de mim hoje?
Hale abriu um sorriso e respondeu:
— Hoje a minha promessa é jamais lhe oferecer chá branco no inverno.
Sem dizer adeus ou se curvar, ele se afastou com um ar esperançoso.
Reparei que Baden estava atrás dele. Minha primeira impressão dele não tinha nada a ver com nossa conversa introdutória. Apenas o enxergava como o garoto que tia May achava promissor.
Percebi que ele estava em dúvida se vinha até mim ou não. Baixei o rosto e levantei novamente, olhando na direção dele. Eu me sentia uma idiota por fazer esse papel, mas funcionou: ele atravessou o salão. Voltei a pensar na jornalista. Era engraçado que eu tivesse aprendido um monte de técnicas de desarme para entrevistas e negociações, mas precisava aprender sozinha a lidar com garotos.
Baden parecia ansioso para conversar comigo, mas ficamos chocados quando outro garoto, vindo de outro lado, se aproximou de mim exatamente no mesmo momento.
— Gunner — Baden o cumprimentou. — O que está achando da festa?
— Excelente. Estava mesmo prestes a agradecer a princesa por organizá-la. Foi um prazer conhecer seus irmãos mais novos.
— Oh, céus. O que eles fizeram dessa vez?
Baden ria enquanto Gunner tentava conter um sorriso.
— Osten é bem… elétrico.
— Culpa dos meus pais — comentei, suspirando. — Parece que quando chega o quarto filho, o desejo de ensinar certos valores voa pela janela.
— Mas eu gosto dele. Espero que fique por perto.
— Difícil prever. Osten é o mais impossível de vigiar. A própria babá, que aliás ele despreza, não consegue acompanhar o ritmo. Ou ele está provocando o caos ou está escondido.
Baden entrou no papo. Não sei se com a intenção de flertar ou de parecer corajoso.
— São dois estados de espírito tão diferentes! — ele disse. — Todo mundo na sua família é assim?
Entendi o que ele queria saber de verdade: será que eu era o tipo de garota que ora procurava sossego, ora agitação, nunca um meio-termo?
— Sem dúvida — respondi.
Baden acenou com a cabeça.
— Bom saber. Vou comprar um escudo e um par de binóculos.
E, droga, eu ri. Não queria, mas ri. Tentei não ficar irritada por baixar a guarda. Ao menos a cena daria umas boas fotos. Fiz uma breve reverência e voltei a circular pelo ambiente.
Vi Henri do outro lado do salão, com Erik seguindo cada um de seus passos. Quando nossos olhares se encontraram, Henri veio imediatamente na minha direção, sorrindo de orelha a orelha.
— Olá! Hyvää iltaa! — disse e lascou um beijo na minha bochecha, o que mais uma vez teria sido um escândalo se qualquer outro tivesse feito o mesmo.
— Ele desejou uma boa noite.
— Ah, err… hivat ilah? — balbuciei, na tentativa de reproduzir as palavras.
Henri riu do meu atentado à sua língua.
— Bom, bom! — comentou.
Será que ele era sempre tão alegre?
Virei para Erik.
— Ficou muito ruim?
Ele explicou com uma voz gentil, mas sem mentir:
— Sinto dizer, mas eu seria incapaz até de imaginar o que você disse.
Abri um sorriso verdadeiro. Aquela dupla era tão despretensiosa e, considerando que Henri devia se sentir sempre meio alheio a tudo, isso era bem impressionante.
Antes que eu pudesse continuar a conversa, Josie apareceu ao meu lado.
— Grande festa, Eadlyn. Você é Henri, certo? Vi sua foto — ela disse apressadamente e logo esticou a mão para cumprimentá-lo.
Henri deve ter ficado confuso, mas aceitou o gesto mesmo assim.
— Meu nome é Josie. Eadlyn e eu somos praticamente irmãs — ela matraqueou.
— Exceto que não temos parentesco algum — acrescentei.
Erik tentou transmitir tudo a Henri rápida e discretamente, o que distraiu Josie.
— Quem é você? — ela perguntou. — Não me lembro de ter visto sua foto.
— Sou o intérprete do Sr. Henri. Ele só fala finlandês.
Josie pareceu incrivelmente frustrada. Foi quando percebi que ela tinha se juntado a nós por achar Henri atraente. De fato, ele parecia mais jovem que quase todos os outros e tinha aquela aura descontraída. Por isso, Josie deve ter pensado que o garoto serviria mais para ela do que para mim.
— Então… — ela começou — como ele, tipo, consegue viver?
Sem nem perguntar a Henri, Erik respondeu:
— Se a senhorita é praticamente irmã da princesa, estou certo de que o palácio lhe proporcionou uma excelente educação. Assim, evidentemente, a senhorita sabe que as relações entre Illéa e a Noruécia são antigas e fortes, o que atrai muitos noruécios para cá, onde eles formam pequenas comunidades, e vice-versa. Não é nada difícil.
Apertei os lábios para não rir daquela maneira tão articulada de pôr Josie no lugar.
— Ah, claro… Hum… — Foi o máximo de esforço que ela fez. — Com licença.
— Desculpem — cochichei logo que ela saiu. — Não tem nada a ver com vocês. Ela é simplesmente terrível.
— Sem problemas — Erik respondeu honestamente.
Ele trocou umas poucas palavras em finlandês com Henri, provavelmente explicando o que tinha acabado de acontecer.
— Me perdoem, preciso falar com alguém, mas vejo vocês no jantar. — Fiz uma reverência para me despedir e os deixei para encontrar algum refúgio.
Aquela entrevista uns minutos antes tinha me derrubado, mas fiquei orgulhosa por ter conseguido juntar os cacos em seguida. Só que Josie tinha a habilidade de me irritar sempre.
Vi minha mãe sozinha e fui em direção a ela o mais rápido possível, esperando encontrar um pouco de paz. Em vez disso, fui recebida com um olhar parecido com o de Ahren quando cheguei.
— Por que você não nos contou o que ia fazer? — ela perguntou discretamente, forçando um sorriso como se não houvesse nada de errado.
Fiz o mesmo ao responder:
— Pensei que seria bom. Foi o que o papai fez.
— Sim, mas em escala bem menor e em particular. Você os envergonhou em público. Ninguém vai admirá-la por isso.
— Sinto muito — disse, suspirando. — Mesmo. Não me dei conta.
Minha mãe passou o braço ao meu redor e disse:
— Não quero ser dura com você. Sabemos do seu esforço.
Bem nesse instante um fotógrafo veio tirar uma foto espontânea de nós duas. Imaginei qual seria a legenda. Algo sobre a Selecionada ensinar a Selecionadora, talvez.
— O que faço agora?
Antes de responder, ela olhou ao redor para garantir que ninguém nos escutava.
— Apenas… considere a possibilidade de um pouco de romance. Nada escandaloso, por favor — ela acrescentou rapidamente. — Mas se você se apaixonar… é isso que as pessoas querem ver.
— Não posso fazer isso acontecer. Não posso…
— America, querida — meu pai chamou.
Aparentemente, Osten tinha derrubado alguma bebida em si mesmo, e minha mãe correu para tirá-lo do salão. Eu podia apostar que aquilo não passava de uma tentativa proposital de Osten para sair da festa.
Fiquei ali, sozinha, tentando ser discreta enquanto corria os olhos pelo salão. Eram muitos desconhecidos. Muitos olhares à espreita e à espera da minha atuação. Já estava pronta para acabar com a Seleção havia muito tempo. Respirei fundo. Três meses eram o preço da minha liberdade. Eu era capaz. Tinha que ser.
Cruzei o salão determinada, sabendo com quem precisava falar. Quando o encontrei, disse em seu ouvido:
— Vá ao meu quarto. Oito horas em ponto. Não conte a ninguém.

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