Dois

 NÃO, NÃO — respondeu a rainha Amberly, rindo. — Tive apenas três madrinhas, apesar de a mãe de Clarkson ter sugerido que eu tivesse mais. Só queria minhas irmãs e minha melhor amiga, que, por acaso, eu conheci durante a Seleção.
Estiquei o pescoço para olhar para Marlee e fiquei feliz de ver que ela também me olhava. Antes de chegar ao palácio, eu tinha para mim que em uma competição com um prêmio tão grande não haveria como alguma das meninas ser simpática. Marlee me acolheu logo que nos conhecemos. Desde então, sempre estamos juntas. Nunca brigamos, a não ser aquelas nossas pequenas discussões.
Semanas atrás, Marlee comentou que talvez não quisesse ficar com Maxon. Quando a pressionei para explicar melhor aquilo, ela se fechou totalmente. Não estava brava comigo – isso eu sabia – mas aqueles dias de silêncio me deixaram bem solitária.
— Quero sete madrinhas — disse Kriss. — Quer dizer, se Maxon me escolher e tiver um supercasamento.
— Bom, eu não quero madrinhas — replicou Celeste. — Elas só servem para desviar a atenção dos outros. E como tudo vai ser televisionado, quero todos os olhares voltados para mim.
Aquilo me subiu o sangue. Eram raras as vezes que conseguíamos conversar com a rainha Amberly, e lá estava Celeste: a praga que arruinava o momento.
— Eu gostaria de incorporar algumas tradições da minha cultura ao casamento — acrescentou Elise, com a voz calma. — As garotas da Nova Ásia usam vermelho na cerimônia, e o noivo precisa levar presentes para os amigos da noiva como agradecimento por deixarem-na se casar com ele.
— Me lembre de ir no seu casamento. Adoro presentes! — soltou Kriss.
— Eu também! — exclamou Marlee.
— Senhorita America, você está tão calada — disse a rainha Amberly. — O que deseja para o seu casamento?
Eu estava completamente despreparada para responder, minhas bochechas coraram.
Só tinha imaginado um tipo de casamento na minha vida, e ele aconteceria no Posto de Serviços da província da Carolina depois de uma sessão de burocracia.
— Bem, só pensei no momento em que meu pai me entrega ao noivo. Sabe, quando ele toma sua mão e põe na mão do seu futuro marido? É a única parte por que eu sempre quis passar de verdade. — Por mais embaraçoso que aquilo pudesse parecer, era a verdade.
— Mas todo mundo faz isso — reclamou Celeste. — Não é nem original.
Deveria ter ficado com raiva depois dessa provocação, mas dei de ombros:
— Quero ter certeza de que meu pai aprova totalmente a minha escolha no único momento realmente importante da minha vida.
— Que bonito — comentou Natalie enquanto bebia chá e olhava pela janela.
A rainha Amberly soltou uma leve risada:
— Tenho certeza de que aprovará. Não importa quem seja.
Essa última frase foi dita repentinamente, como se a rainha tivesse percebido no meio da fala a sua sugestão de que Maxon seria o escolhido.
Fiquei pensando se ela achava isso, se Maxon contara a ela sobre nós.
Logo depois, o assunto do casamento morreu, e a rainha nos deixou para ir trabalhar em seu quarto. Celeste estacionou em frente àquele televisor enorme e as outras garotas começaram a jogar cartas.
— Foi divertido — disse Marlee, enquanto nos sentávamos à mesa. — Acho que nunca tinha visto a rainha falar tanto.
— Ela está começando a se empolgar, acho.
Eu não tinha comentado com ninguém o que a irmã da rainha Amberly me dissera sobre as muitas tentativas frustradas da rainha de ter outro filho. Adele tinha previsto que a irmã seria mais carinhosa conosco assim que o grupo diminuísse, e acertou.
— Agora, você tem que me contar: você não tem mesmo nenhum outro plano para o seu casamento ou apenas não queria revelar?
— Não tenho mesmo — assegurei. — É difícil para mim planejar um casamento tão grande, sabe? Sou uma Cinco.
Marlee balançou a cabeça.
— Você era uma Cinco. Agora é Três.
— Certo — concordei, lembrando do meu novo rótulo.
Nasci em uma família de Cincos – artistas e músicos que geralmente ganhavam mal – e, embora odiasse o sistema de castas, gostava do que fazia para ganhar a vida. Era estranho pensar em mim como uma Três, imaginar uma carreira de professora ou escritora.
— Chega de estresse — falou Marlee, como se pudesse ler meus pensamentos. — Você não precisa se preocupar com isso ainda.
Eu estava a ponto de contrariá-la, quando fui interrompida por um grito de Celeste.
— Vai! — berrou, batendo o controle remoto no sofá antes de apontá-lo para a TV de novo. — Argh!
— É impressão minha ou ela está piorando? — cochichei com Marlee.
Observamos Celeste bater no controle remoto diversas vezes até desistir e mudar de canal manualmente. Comecei a achar que, se eu tivesse nascido uma Dois, aí sim teria com que me preocupar.
— Acho que é estresse — Marlee comentou. — Você notou como Natalie tem estado, sei lá... mais distante?
Fiz que sim com a cabeça, e olhamos para as três meninas jogando cartas. Kriss sorria ao embaralhar as cartas, enquanto Natalie examinava as pontas de seu cabelo e de vez em quando arrancava um fio. Ela tinha um ar distraído.
— Acho que todas nós estamos sentindo isso — confessei. — Ficou mais difícil relaxar e curtir o palácio agora que o grupo é tão pequeno.
Celeste resmungou algo e nos viramos para olhá-la, mas logo voltamos à posição inicial quando ela nos pegou espiando.
— Com licença — disse Marlee, mudando de lugar. — Acho que vou ao banheiro.
— Pensei na mesma coisa. Vamos juntas? — propus.
Com um sorriso, ela balançou a cabeça para negar.
— Vai na frente. Vou terminar o chá primeiro.
— Tudo bem. Já volto.
Saí do Salão das Mulheres, caminhando devagar por aquele corredor magnífico. Eu duvidava que algum dia chegaria a me acostumar com o espetáculo que era aquele castelo. Estava tão distraída que, ao dobrar uma esquina, trombei com um guarda.
— Ops! — exclamei.
— Perdão, senhorita. Espero não tê-la assustado.
Ele me segurou pelos cotovelos para que eu recuperasse o equilíbrio.
— Não — afirmei, rindo. — Está tudo bem. Eu devia olhar melhor por onde ando. Obrigada por me segurar, soldado...
— Woodwork — completou, fazendo uma breve reverência com a cabeça.
— Eu sou America.
— Eu sei.
Sorri e suspirei. É claro que ele sabia.
— Bom, espero que da próxima vez que nos trombarmos seja apenas no sentido figurado — brinquei.
— Positivo. Tenha um bom dia, senhorita — ele respondeu.
— Você também.
Voltei e contei a Marlee sobre a minha trombada vergonhosa com o soldado Woodwork. Avisei a ela para olhar por onde anda. Ela soltou uma gargalhada.
Passamos o resto da tarde sentadas perto das janelas, conversando sobre as nossas casas e as outras garotas e bebendo chá sob a luz do sol.
Era triste pensar no futuro. Cedo ou tarde, a Seleção chegaria ao fim, e embora eu soubesse que Marlee e eu continuaríamos próximas, sentiria falta de conversar com ela todos os dias. Ela foi a primeira amiga de verdade que fiz na vida e gostaria de tê-la sempre ao meu lado.
Enquanto eu tentava curtir aquele momento, Marlee olhava pela janela com um ar sonhador. Tentei imaginar no que ela estaria pensando, mas estava tudo tão sereno que não quis perguntar.

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