Vinte e Um

FOMOS POUPADAS DA HUMILHAÇÃO de tratar do resultado das nossas recepções no Jornal Oficial. As visitas estrangeiras foram mencionadas por cima, mas os eventos não foram informados ao público. Foi apenas na manhã seguinte que Silvia e a rainha vieram falar conosco sobre nosso desempenho.
— Confiamos a vocês uma tarefa muito assustadora, que com certeza poderia ter fracassado terrivelmente. Tenho o prazer de dizer, no entanto, que ambas as equipes foram muito bem — anunciou Silvia enquanto nos olhava como se nos julgasse.
Todas respiramos aliviadas, e eu estendi a mão para Kriss, que fez o mesmo. Embora estivesse confusa sobre sua relação com Maxon, eu sabia que não teria conseguido sozinha.
— Para ser honesta, um evento foi um pouco superior ao outro, mas todas vocês podem se orgulhar. Nossos velhos amigos da Federação Alemã nos enviaram cartas de agradecimento à recepção graciosa — disse Silvia, olhando para Celeste, Natalie e Elise. — Aconteceram algumas falhas mínimas, e não saberia dizer se alguma de nós gosta de eventos tão sérios como aquele. Os convidados, porém, com certeza gostaram.
Em seguida, olhando para Kriss e para mim, continuou:
— Quanto a vocês duas, as damas da Itália divertiram-se imensamente. Ficaram muito impressionadas com o estilo, com a comida... e fizeram questão de perguntar pelo vinho que vocês serviram. Bravo! Não me surpreenderia se Illéa ganhasse um novo aliado maravilhoso por conta dessas boas-vindas. Vocês merecem muitos elogios.
Kriss estrilou de alegria ao passo que eu deixei escapar uma risada nervosa, feliz por aquilo finalmente ter acabado. E ainda mais por termos vencido.
Silvia passou a falar do relatório que escreveria ao rei e a Maxon, mas garantiu que nenhuma de nós teria nada que temer. Enquanto ela falava, uma criada se esgueirou pela porta e correu até a rainha para cochichar algo.
— Claro que podem — disse a rainha, para em seguida levantar-se de supetão e dar um passo à frente.
A criada retirou-se depressa e abriu a porta para o rei e Maxon. Eu sabia que homens não podiam entrar naquele salão sem a permissão da rainha, mas era cômico ver essa regra em funcionamento.
Assim que eles entraram, todas nós levantamos e fizemos uma reverência, mas os dois não pareciam estar interessados em formalidades.
— Caras senhoritas, pedimos desculpas por invadir esse espaço, mas temos notícias urgentes — disse o rei.
— Receio que a guerra tenha recrudescido na Nova Ásia — Maxon falou, com voz firme. — A situação é tão calamitosa que meu pai e eu partiremos neste exato momento para tentar ajudar de alguma maneira.
— O que há de errado? — perguntou a rainha, com as mãos no peito.
— Nada com que se preocupar, meu amor — o rei respondeu com convicção. A afirmação não podia ser completamente sincera, já que ambos tinham que sair às pressas.
Maxon foi até sua mãe e os dois trocaram poucas palavras em voz baixa. Por fim, ela beijou a testa do filho, e ele lhe deu um abraço antes de se afastar. O rei, então, começou a recitar uma lista de instruções para a rainha, ao passo que Maxon veio se despedir de cada uma de nós.
Seu adeus a Natalie foi tão breve que era como se não tivesse ocorrido. Mas ela não pareceu se incomodar com isso. Eu não conseguia entender a situação. Será que ela realmente não se importava com a falta de carinho de Maxon, ou estava tão incomodada que se obrigou a parecer calma?
Celeste se pendurou em Maxon e explodiu na pior demonstração de choro falso que eu já vi em minha vida. Lembrei-me de quando May era mais nova e pensava que suas lágrimas trariam, em um passe de mágica, o dinheiro necessário para comprarmos algo que quiséssemos. Quando Maxon conseguiu se afastar daqueles braços, Celeste estalou um beijo em seus lábios, que ele limpou – da maneira mais educada possível – assim que lhe deu as costas.
Eu estava tão perto de Elise e Kriss que pude ouvir as despedidas.
— Ligue para eles e diga para irem com mais calma — Maxon pediu a Elise.
Quase tinha me esquecido de que a verdadeira razão de Elise ainda estar aqui eram seus laços familiares com os líderes da Nova Ásia. Me perguntei se a vaga dela ficaria em risco caso a guerra fosse ladeira abaixo.
E foi então que me dei conta de que não fazia ideia do que Illéa perderia se perdesse a guerra.
— Se você conseguir um telefone, falarei com meus pais — prometeu ela.
Maxon fez que sim com a cabeça e beijou-lhe as mãos para depois ir até Kriss.
Ela imediatamente entrelaçou seus dedos com os dele.
— Você correrá perigo? — ela perguntou baixo, e sua voz começava a tremer.
— Não sei. Em nossa última viagem à Nova Ásia, a situação não estava tão tensa. Não posso ter certeza dessa vez.
A voz de Maxon era tão carinhosa que fiquei com a impressão de que eles já tinham falado sobre isso em particular. Kriss levantou os olhos para o teto e suspirou; nesse curto segundo, Maxon olhou para mim. Virei o rosto.
— Por favor, tenha cuidado — ela sussurrou.
Uma lágrima corria por sua bochecha.
— Claro, minha cara — Maxon fingiu saudá-la como um soldado, o que a fez rir um pouco. Ele então beijou sua bochecha e falou ao ouvido dela: — Por favor, tente distrair minha mãe. Ela fica preocupada.
Ele se afastou para olhá-la nos olhos. Kriss inclinou a cabeça, assentindo, e soltou sua mão. No instante em que perderam o contato físico, um tremor tomou conta do corpo dela. As mãos de Maxon se retesaram por um segundo, como se ele fosse abraçá-la. Em vez disso, ele se retirou e veio em minha direção.
Como se já não me bastassem as palavras de Maxon na semana passada, ali estava uma prova da relação entre os dois. Ao que parecia, tinham algo muito doce e real. A cena de Kriss com as mãos no rosto era prova de quanto ela se importava com ele. Ou isso, ou ela era uma atriz incrível.
Tentei comparar a expressão dele quando olhava para mim com o modo como ele olhava para Kriss. Seria o mesmo jeito? Haveria menos ternura quando se voltava para ela?
— Tente não arrumar confusão enquanto eu estiver fora — provocou Maxon.
Ele não brincou com Kriss. Isso significaria alguma coisa?
Levantei a mão direita e prometi:
— Juro que me comportarei da melhor forma possível.
— Excelente. Uma coisa a menos com que me preocupar — ele comentou, rindo.
— E nós? Devemos ficar preocupadas?
Maxon balançou a cabeça.
— Em princípio, somos capazes de suavizar seja lá o que estiver acontecendo. Meu pai pode ser bastante diplomático e...
— Mas você é tão burro às vezes — eu disse, para a surpresa de Maxon, que franziu a testa. — Eu perguntei de você. Devemos nos preocupar com você?
Seu rosto assumiu contornos sérios, o que não diminuiu em nada meus receios.
— Em princípio, vamos chegar e partir o mais rápido possível. Se conseguirmos aterrissar... — Maxon engoliu em seco, e pude notar como estava assustado.
Quis lhe fazer outra pergunta, mas não sabia o que dizer.
Ele limpou a garganta e começou:
— America, antes de partir...
Olhei nos olhos de Maxon e senti as lágrimas brotarem nos meus.
— ... quero que você saiba que tudo...
— Maxon! — berrou o rei. O príncipe ergueu a cabeça à espera das ordens do pai. — Temos que ir.
Maxon fez que sim com a cabeça.
— Adeus, America — disse em voz baixa.
Depois, levou minha mão a seus lábios. Ao fazer isso, reparou no bracelete artesanal que eu usava. Ele o analisou com ar confuso e beijou minha mão carinhosamente.
Aquele beijo me levou de volta a uma lembrança que parecia já ter anos. Ele tinha beijado minha mão como na minha primeira noite no palácio, quando gritei com ele, quando ele me deixou ficar mesmo assim.
Os olhos das outras meninas estavam cravados no rei e em Maxon, que saíam. Já eu observava a rainha. Seu corpo inteiro parecia fraco. Quantas vezes seu marido e seu único filho se arriscariam até que ela desabasse completamente?
Assim que a porta fechou e impediu que visse sua família do lado de fora, a rainha Amberly piscou algumas vezes, respirou fundo e recobrou forças para reassumir sua postura habitual.
— Desculpem-me, senhoritas, mas essas notícias repentinas requerem muito trabalho de minha parte. Penso que é melhor ir para o meu quarto para concentrar-me — ela fazia um esforço enorme para falar. — Que tal o almoço ser servido aqui, para que vocês comam quando quiserem? À noite, junto-me a vocês para o jantar.
Concordamos.
— Excelente — disse ela, para depois sair.
Sabia que a rainha era forte. Ela tinha crescido em um bairro pobre de uma província pobre. Trabalhara em uma fábrica até ser escolhida para a Seleção. E depois, já no trono, perdeu uma gravidez após a outra antes de finalmente dar à luz um filho. Ela voltaria para seu quarto como uma dama, como pedia sua posição. Mas choraria quando estivesse sozinha.
Assim que a rainha saiu, Celeste fez o mesmo. Decidi, então, que tampouco precisava ficar. Fui para o meu quarto, para ficar só e refletir.
Continuei a pensar em Kriss. Como ela e Maxon ficaram tão íntimos de repente? Pouco tempo atrás, ele tinha me feito promessas sobre nosso futuro. Ele não podia estar tão interessado nela se me dizia coisas tão íntimas. Deve ter acontecido depois.
O dia passou depressa. Depois do jantar, enquanto minhas criadas me preparavam para a cama, uma frase bastou para que eu parasse com minhas reflexões.
— Sabe quem eu encontrei esta manhã em seu quarto, senhorita? — perguntou Anne, que escovava meus cabelos.
— Quem?
— O soldado Leger.
Gelei, mas apenas por uma fração de segundo.
— Hein? — foi minha reação.
Mantive uma expressão distante como se continuasse com meus pensamentos.
— Sim — disse Lucy. — Ele disse que estava revistando seu quarto. Algum assunto de segurança — relatou, um tanto confusa.
— Foi estranho — disse Anne, com a mesma expressão de Lucy. — Ele vestia roupas comuns, não o uniforme. Ele não deveria cuidar da segurança nos momentos de folga.
— Ele deve ser muito dedicado — comentei com um tom de voz despreocupado.
— Acho que sim — concordou Lucy, admirada. — Sempre que o encontro no palácio, ele está prestando atenção em tudo. É um soldado muito bom.
— Verdade — disse Mary. — Alguns dos homens que chegam aqui claramente não servem para o trabalho.
— E ele fica bem com roupas comuns. A maioria deles é horrível sem uniforme — comentou Lucy.
Mary riu e corou; até Anne abriu um sorriso. Fazia tempo que não as via tão à vontade. Em algum outro dia, talvez tivesse sido divertido fofocar sobre os guardas. Não naquele. Eu só conseguia pensar que havia uma carta de Aspen no meu quarto. Quis virar a cabeça para olhar o meu jarro, mas não arrisquei.
Tive a impressão de que elas demoraram uma eternidade até saírem do quarto e me deixarem sozinha. Me forcei a ser paciente e esperar alguns minutos para garantir que não voltariam. Por fim, voei até a cabeceira da cama e agarrei o jarro. Como esperado, lá estava a pequena tira de papel.

Maxon está fora. Isso muda tudo!

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